Medidas para conter enchentes ficam no papel

12/01/2011 10:14

 

Ações deliberadas nos meses seguintes à enchente que aconteceu no réveillon de 2002 na Cidade de Goiás até hoje não saíram do papel. Na época do transbordamento que varreu parte do patrimônio histórico do município, que acabara de ser oficializado como pertencente à humanidade, foram realizados relatórios e pareceres que solicitavam série de medidas para evitar uma nova tragédia. A maioria foi ignorada.

Um dos relatórios foi elaborado pelo Conselho Internacional de Monumentos e Sítios Históricos (Icomos, da sigla em inglês), braço da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). No documento, a instituição afirma o caráter ambiental da tragédia acontecida há nove anos, causada pelo assoreamento e pela diminuição gradativa da vazão do Rio Vermelho.

O Icomos cobrou a retirada de um aterro nas margens do rio, ao longo da Avenida Beira Rio, no prazo de 90 dias. O aterro foi construído no final da década de 1960 para promover o alargamento da via e nele foram edificados pontos comerciais. Até hoje o aterro permanece intacto.

O conselho ainda pediu o impedimento de novas edificações na caixa de vazão do rio e a reconstrução das pontes tradicionais. O Iphan defende mudar para pontes de "mão francesa", que são mais elevadas e favorecem o escoamento do rio.

O parecer da Defesa Civil cobrava a remoção de 14 edificações situadas na área do aterro, obstruindo a vazante do rio. No entanto, a demolição aconteceu somente por força judicial. A Defesa Civil ainda cobrou melhorias na rede coletora de águas pluviais e obras de drenagem.

Por outro lado, parte da população cobra a retirada de uma grande pedra do leito do rio. A prefeitura é simpática à medida, mas esbarra no Iphan. O instituto sustenta que nunca recebeu parecer sobre a remoção.

Todas essas medidas visavam amenizar um quadro adverso no qual a Cidade de Goiás para sempre terá de lidar. Situado numa região considerada de alta vulnerabilidade para enchentes, o município reúne características que o obrigam a conviver com o risco de novas tragédias. O problema é que as ações humanas em vez de amenizar a situação têm potencializado a força agressiva da natureza.

A Cidade de Goiás está encravada no centro de um terreno com grande declividade. Possui solo raso - onde dificilmente penetra água. Para completar, o manancial que corta a cidade leva as águas das chuvas para o mesmo ponto: o Rio Vermelho.

"A cidade está onde não deveria, mas isso é irreversível. Ela é patrimônio da humanidade e temos de intervir para amenizar o problema", disse geólogo Pedro Vieira, da Universidade Federal de Goiás (UFG). Com pesquisas sobre a região da Cidade de Goiás desde a enchente de 2002.

O geólogo afirma que as construções espremem cada vez mais o leito do rio, o que deixa a correnteza com mais fúria. Na zona rural, o problema maior refere-se ao desmatamento proveniente da pecuária. Com pouca cobertura vegetal nas margens, as águas encontram menos barreiras para diminuir a força.

Os estudos elaborados por Pedro Vieira apontam uma recorrência de grandes transbordamentos em intervalos de 80 anos e outros de menor intensidade a cada 10 anos. "Embora tenha ocorrido uma enchente nesse ano, existe a possibilidade de acontecer de novo nesta temporada", alertou.

O prefeito da Cidade de Goiás, Joaquim Berquó Neto, disse que precisa esperar as chuvas acabarem e fazer um levantamento dos estragos para pensar em novas medidas.

Casarões históricos desabam

Duas casas desabaram na madrugada de ontem na Cidade de Goiás, devido às fortes chuvas do dia anterior. Ambas as moradias eram construções coloniais do século XIX, feitas de adobe e tombadas como patrimônio histórico. Uma pessoa idosa ficou desabrigada.

As residências estão localizadas fora da área de vazão do Rio Vermelho e livres das enchentes. No entanto, a força das águas deixou somente escombros no lugar das duas casas. Uma delas ainda resistiu e manteve uma parte em pé, que recebia reparos na tarde de ontem.

Pelo menos outras seis casas antigas correm risco de desabar na Cidade de Goiás. Para evitar tragédias humanas e perdas do patrimônio histórico, a Superintendência do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) trouxe de Goiânia um engenheiro estrutural para coordenar os cuidados que as residências receberão. As casas serão escoradas com estacas de madeira, que apoiarão as estruturas comprometidas.

Essas casas são habitadas sobretudo por pessoas idosas e resistentes à mudança de endereço. Por esse motivo, a superintendente do Iphan em Goiás, Salma Saddi, tentará convencer moradores a deixar o imóvel temporariamente.

Depois de uma trégua de quase 18 horas, voltou a chover logo que amanheceu o dia de ontem na Cidade de Goiás. A chuva se manteve durante toda a manhã, o que impediu a realização de uma vistoria que seria feita pelo Corpo de Bombeiros do município. O planejado era sobrevoar as nascentes, cabeceiras e represas do Rio Vermelho.

Houve momentos em que choveu mais forte, torrencialmente. Porém, sem capacidade de alterar o nível do rio. "A situação está sob controle, mas o estado de alerta continua, com monitoramento 24 horas", afirmou o comandante dos Bombeiros, major Jailton Pinto Figueiredo.

Casa de cora
A casa onde morou Cora Coralina passou a manhã com as janelas abertas, com uma imagem da poeta olhando o rio e a cidade pela janela. No entanto, na porta do centro de visitação tinha um aviso de que o local permaneceria fechado ontem. Como precaução, o Iphan quer manter o local sem funcionar por mais 10 dias. O acervo foi retirado durante a enchente de segunda-feira e levado ao Convento das Dominicanas, ao lado da Igreja do Rosário.


A ponte do Carmo permanece interditada. Feita de madeira, a estrutura dá acesso ao Hospital de Caridade São Pedro D´Alcântara teve uma das vigas de sustentação quebrada.

 


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